Newsletters

A nova agenda do governo para a simplificação fiscal

07 April 2025
A nova agenda do governo para a simplificação fiscal
Newsletters

A nova agenda do governo para a simplificação fiscal

07 April 2025

O ENQUADRAMENTO

O Conselho de Ministros aprovou, no passado dia 16 de janeiro de 2025, uma Agenda para a Simplificação Fiscal, contendo um conjunto de 30 medidas com três objetivos principais: a redução de custos de contexto, uma maior transparência e compreensão das obrigações tributárias e melhoria da qualidade dos serviços prestados.

Assim, propôs o Governo medidas que visam combater quatro grandes desafios: (i) uma maior e melhor comunicação com os contribuintes; (ii) mais eficiência no uso dos recursos da Administração tributária; (iii) melhoria no diálogo com os agentes económicos, e (iv) a simplificação e digitalização de procedimentos.

Tendo presente que se trata de medidas de cariz procedimental, as mesmas não terão necessariamente impacto numa potencial redução da carga fiscal, mas poderão ser importantes na redução dos custos de contexto e de cumprimento.

No passado dia 27 de março de 2025, foi publicado o Decreto-Lei n.º 49/2025 de 27 de março que concretiza parte das medidas propostas na Agenda para a simplificação fiscal.

O OBJETIVO DE REDUÇÃO DE CUSTOS DE CONTEXTO

A Agenda para a Simplificação Fiscal ora divulgada tem como um dos seus principais objetivos a redução dos custos de contexto.

Apesar de ainda não existirem detalhes, concretos, sobre as medidas anunciadas, salientamos as medidas referentes à:

  • simplificação da Informação Empresarial Simplificada (IES)
  • revisão das regras de pedidos de reembolso de IVA
  • simplificação das regras de faturação
  • revisitação de procedimentos no âmbito dos Impostos Especiais de Consumo e do regime do SAFT-T (PT) Contabilidade, entre outros

O OBJETIVO DA TRANSPARÊNCIA E DA COMPREENSÃO DAS OBRIGAÇÕES TRIBUTÁRIAS

Prevê o Governo, também, a introdução de medidas tendentes a melhorar o apoio ao contribuinte no preenchimento da sua declaração anual de IRS, bem como a desmaterialização da documentação que é necessária, nomeadamente, no âmbito do Regime de bens em circulação.

Nota-se, ainda, uma preocupação com uma melhoria da infraestrutura do Portal das Finanças, tendo em vista a introdução de ferramentas de inteligência artificial visando a celeridade na resposta ao contribuinte, o que se depreende a introdução de chatbots, ou a melhoria do chatbot já existente — o CATiA, introduzido em julho de 2024, e que também se interliga com o objetivo seguinte.

O OBJETIVO DE MELHORIA DA QUALIDADE DOS SERVIÇOS

No que respeita à qualidade dos serviços prestados pela Administração Tributária, prevê-se, entre o mais, a modernização do Portal das Finanças, através de uma abordagem mais intuitiva, acessível e eficiente, ao fazer uso de ferramentas de Inteligência Artificial para acelerar a resposta ao contribuinte.

AS MEDIDAS DE PROPOSTAS (DESTAQUES)

NO IMPOSTO SOBRE O VALOR ACRESCENTADO (IVA)

  • simplificação dos procedimentos para a concessão de reembolsos de IVA
  • submissão automática das declarações periódicas de IVA de pessoas singulares sem operações tributáveis
  • revisão do regime dos certificados de renúncia à isenção de IVA
  • alteração dos prazos para pedido de pagamento em prestações do IVA
  • isenção da declaração aduaneira de exportação e simplificação de processos aduaneiros

NO IMPOSTO SOBRE O RENDIMENTO DAS PESSOAS COLETIVAS (IRC)

  • simplificação da IES
  • pré-preenchimento dos prejuízos fiscais relativos aos anos anteriores na Declaração Modelo 22
  • simplificação das regras de faturação eletrónica
  • dispensa de retenção na fonte para valores inferiores a € 25

NO IMPOSTO SOBRE O RENDIMENTO DAS PESSOAS SINGULARES (IRS)

  • simplificação e apoio técnico no preenchimento e cumprimento das obrigações declarativas, nomeadamente, declaração de IRS e declaração de início/alteração de atividade
  • criação de uma identificação fiscal diferenciada para a Categoria B

NO IMPOSTO ÚNICO DE CIRCULAÇÃO (IUC)

  • simplificação da liquidação e cobrança do IUC

NO IMPOSTO DO SELO (IS)

  • fixação, em € 10, do montante mínimo para o reembolso do Imposto do Selo
  • simplificação do Imposto do Selo no âmbito das transmissões gratuitas

AS MEDIDAS DO DESPACHO N.º 14/2025-XXIV

Por Despacho da Secretária de Estado dos Assuntos Fiscais n.º 14/2025-XXIV, de 31 de janeiro, tendo em vista o objetivo, da Agenda para a Simplificação Fiscal, de harmonizar prazos para cumprimento das obrigações declarativas, foi determinada a dispensa de aplicação de acréscimos ou penalidades pelo atraso no cumprimento da obrigação de entrega da Declaração Modelo-10, referente aos rendimentos pagos e respetivas retenções de imposto.
Sendo que esta dispensa é apenas aplicável caso a declaração referida seja entregue até ao dia 28 de fevereiro de 2025 (o prazo legal é 10 de fevereiro).

Esta medida tratar-se-á de um “remendo”, para este ano de 2025, em antecipação de uma futura alteração legislativa que venha a consagrar a alteração do prazo de entrega dessa declaração, ou outra solução.

AS MEDIDAS DOS DIPLOMAS APROVADOS EM CONSELHO DE MINISTROS DE 20 DE FEVEREIRO DE 2025

No Conselho de Ministros do passado dia 20 de fevereiro foram aprovados dois diplomas, logo promulgados pelo Presidente da República no dia 22 de fevereiro, referentes a obrigações declarativas em sede de IRS e que, num dos casos, tinham levantado alguma polémica.

Foi ainda, publicado no diário da Républica no dia 6 de março de 2025, o Decreto-Lei que elimina a obrigação de reporte dos rendimentos sujeitos a taxas liberatórias não englobados e rendimentos não sujeitos a IRS — uma medida que era estranha no contexto do ordenamento jurídico-fiscal português e que apresentava polémica — e que clarificará quais os ativos detidos em países, territórios ou regiões com um regime fiscal claramente mais favorável que devem ser declarados, de forma a, refere-se, assegurar a certeza jurídica e a operacionalização efetiva desta obrigação declarativa.

Adicionalmente, foi promulgado um Decreto Regulamentar que alarga o universo dos sujeitos passivos abrangidos pela declaração automática de IRS, anunciando-se o objetivo de incluir as liquidações de IRS a que seja aplicada a dedução à coleta relativa aos encargos suportados com a prestação de trabalho doméstico.

AS MEDIDAS DO DECRETO-LEI N.º 49/2025, DE 27 DE MARÇO

CÓDIGO DO IMPOSTO SOBRE O RENDIMENTO DAS PESSOAS SINGULARES (CIRS)

O intuito da grande maioria das alterações efetuadas ao presente código está relacionado com a harmonização de prazos, com a alteração de grande parte dos prazos previstos neste Código para o final de fevereiro.

Uma medida de simplificação é a dispensa de retenção na fonte dos rendimentos de Categoria B, E e F, sempre que o montante de cada retenção seja inferior a € 25.

No que se refere à Categoria B, sem prejuízo de não ter, ainda, sido criada uma “identidade própria”, como anunciado, notamos que foi alterado o procedimento de classificação de faturas da atividade, o que será melhor abordado infra.

CÓDIGO DO IMPOSTO SOBRE O RENDIMENTO DAS PESSOAS COLETIVAS (CIRC)

No que se refere às alterações em sede do Código do IRC, as medidas foram no sentido de harmonização de procedimentos, como por exemplo, a dispensa de retenção na fonte de quando o montante de cada retenção na fonte é inferior a € 25 e, ainda, a eliminação da expressão “ou documento legalmente equiparado”, admitindo-se apenas as faturas, emitidas nos termos do Código do IVA, como documentos comprovativos de gastos.

Foi ainda introduzida uma nova referência expressa aos ativos intangíveis para efeitos da aceitação fiscal das perdas por imparidade registadas com ativos não correntes, nas mesmas condições já previstas em que o abate físico, o desmantelamento, o abandono ou inutilização não ocorram no mesmo período de tributação

É de salientar, ainda, a nova alteração ao regime dos lucros e prejuízos obtidos por estabelecimento estável situado fora de Portugal, existindo uma nova comunicação (declaração de início/alterações), no prazo de 30 dias contados da data da constituição do estabelecimento estável no estrangeiro, para a comunicação da opção e renúncia (tendo como limite o último dia do período de tributação em que se pretende iniciar o regime).

CÓDIGO DO IMPOSTO SOBRE O VALOR ACRESCENTADO (CIVA)

As alterações efetuadas ao CIVA estão relacionadas com a harmonização terminológica e de procedimentos, bem como a sua simplificação.

É revogada, na IES, a obrigação da submissão do Mapa Recapitulativo de Clientes – Anexo O – e a Declaração anual do Imposto do Selo – Anexo Q – (o Anexo O apenas abrangia sujeitos passivos não residentes com registo de IVA em Portugal).

Existe uma atualização da terminologia na indicação dos documentos a ser obtidos quando exista a intervenção dos serviços aduaneiros.

Deixa, ainda, de estar prevista a obrigação de apresentação de declaração de início de atividade em atos isolados, ainda que superiores a € 25.000

No que se refere à declaração periódica de IVA, foram alterados os regimes mensal e trimestral, assim, (i) se volume de negócios for inferior € 650.000 e o sujeito passivo optar pelo regime mensal, deixa de existir a obrigação de manutenção por um período mínimo de 3 anos no regime mensal e, bem assim, (ii) se o volume de negócios for superior a € 650.000 em determinado ano civil, os sujeitos passivos passam a ter a obrigação de apresentação de declaração de alterações em janeiro do ano seguinte, com efeitos a 1 de janeiro.

Ademais, existe uma alteração ao registo das operações efetuadas por sujeitos passivos que não disponham de contabilidade organizada, nomeadamente:

  • substituição dos livros de registo (de compra de mercadorias; de matérias-primas e de consumo; de venda de produtos; de produtos fabricados; de serviços prestado, entre outros) pela classificação das operações (tituladas por fatura) no Portal das Finanças
  • a classificação tem de ser efetuada antes do prazo da declaração periódica respetiva

Por fim, é criada a declaração periódica do IVA de modo automático (já existindo por opção do sujeito passivo) que consiste numa “declaração provisória”, de modo automático, que terá por base as classificações efetuadas pelo sujeito passivo, sendo que este último deverá confirmar ou alterar a declaração (faltando ainda a sua concretização por Portaria nomeadamente para se saber o universo de sujeitos passivos abrangidos).

CÓDIGO DO IMPOSTO DE SELO (CIS)

Foram efetuadas duas alterações, nomeadamente:

  • sempre que o imposto deva ser liquidado pelos serviços da administração fiscal, só se procede a respetiva cobrança ou reembolso se o seu quantitativo for igual ou superior a € 10
  • a notificação para a liquidação do imposto nas transmissões gratuitas deve identificar o método de pagamento desse mesmo imposto, sendo o pagamento do Contribuinte a escolha da forma de pagamento (com desconto ou em prestações), não podendo alterar posteriormente essa modalidade

CÓDIGO DO IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE IMÓVEIS (CIMI)

Existe uma simplificação do procedimento da iniciativa da primeira avaliação do imóvel.

CÓDIGO DO IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE AS TRANSMISSÕES ONEROSAS DE IMÓVEIS (CIMT)

Também no Código do IMT há uma simplificação do processo, nomeadamente, a certidão que comprova a possibilidade de beneficiar de isenção de IMT para aquisições de imóveis para revenda passa a ser obtida através do Portal das Finanças, deixando de ser solicitada nos serviços de finanças.

ESTATUTO DOS BENEFÍCIOS FISCAIS

Altera-se o prazo para final do mês de fevereiro da comunicação dos membros do agregado familiar que frequentam estabelecimentos de ensino situados em território do interior ou das regiões autónomas, do valor total das respetivas despesas suportadas e das faturas de arrendamento por transferência residência para território do interior.

LEI GERAL TRIBUTÁRIA (LGT)

A Administração tributária passa a ter um prazo de 90 dias (ao invés de 120 dias) para disponibilizar no Portal das Finanças os formulários digitais para cumprimento de obrigações declarativas.

CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO (CPPT)

A validade das certidões comprovativas de situação tributária regularizada passa de 3 para 4 meses.

REGIME COMPLEMENTAR DO PROCEDIMENTO DE INSPEÇÃO TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (RCPITA)

Em caso de requerimento de regularização, é eliminada a obrigatoriedade da reunião de regularização, que passa a ser facultativa.

A Administração tributária disponibilizará uma proposta de documento de regularização, que ou é aceite pelo sujeito passivo ou este poderá requerer a reunião de regularização.

DECRETO-LEI N.º 125/2021 (REGIME DE PAGAMENTO EM PRESTAÇÕES DE TRIBUTOS)

A principal alteração consubstancia-se no deferimento automático do pedido de pagamento em prestações nas situações inferior a € 5.000 (pessoa singular) ou € 10.000 (pessoa coletiva).

OBSERVAÇÕES FINAIS

A Agenda para a Simplificação Fiscal, ora aprovada pelo Governo, é uma iniciativa que se aplaude. De facto, é objetivamente benéfico para o nosso sistema fiscal a existência de medidas que visam tornar a Administração tributária mais expedita e mais próxima na resposta aos contribuintes, simplificando processos e obrigações declarativas — diminuindo os custos de cumprimento e de contexto fiscal para as empresas e os contribuintes — dando-se resposta a um serviço público que é, e deverá ser, de excelência, colocando, assim, o contribuinte em primeiro lugar!

Destaque-se, porém, que estas medidas não resolvem o problema de fundo do sistema fiscal português, atendendo a que não é bom manter-se um nível de tributação tão elevado (e pouco competitivo) em termos internacionais, quer na tributação sobre as pessoas singulares, quer no da tributação sobre as pessoas coletivas.

***

Rogério Fernandes Ferreira
Marta Machado de Almeida
Álvaro Silveira de Meneses
Miriam Campos Dionísio
João de Freitas Jacob
José Nuno Vilaça
Joana Fidalgo Barreiro

Know-How